Respiração cutânea: como os animais respiram pela pele?

Texto por: Guilherme de Espindola da Silveira, Jozias Fortes e Juliana Antonia da Silva

Existem muitas formas de respirar. Nós humanos, assim como a maioria dos vertebrados terrestres, enchemos nossos pulmões de ar atmosférico, enquanto boa parte dos peixes faz com que a água flua por entre suas brânquias. Mas, você sabia que muitos desses animais, incluindo você, consegue literalmente respirar pela pele1?

Como você deve imaginar, não somos muito bons nisso, e a respiração cutânea só é capaz de suprir uma parcela minúscula de nossa necessidade de troca gasosa, de forma que a respiração pulmonar é obrigatória1. Por outro lado, entre os vertebrados, os anfíbios são mestres nessa arte, e podem realizar desde 20% até impressionantes 100% de sua respiração através da pele2. Uma família inteira de salamandras, ao longo de seu desenvolvimento, perde por completo seus pulmões antes de atingir o estágio adulto3, dependendo completamente de sua pele para realizar trocas gasosas, seja dentro ou fora da água1,2. Essa estratégia deu tão certo que, atualmente, as salamandras-sem-pulmão representam dois terços de todas as espécies de salamandras existentes, podendo ser encontradas desde a Amazônia até o sul do Canadá4. No entanto, a incrível habilidade de respirar apenas pela pele traz consigo uma série de limitações e, para compreendê-las, precisamos primeiro entender como a respiração cutânea funciona.

Figura 1: Aneides ferreus, uma salamandra-sem-pulmão.Fonte: Image by wirestock on Freepik

Primeiramente, por que os seres vivos respiram? De forma bastante resumida, o O2 (gás oxigênio) é utilizado pelas células na oxidação de moléculas orgânicas, um processo que envolve uma série de reações químicas. O resultado dessas reações é a liberação de uma grande quantidade de energia, água e CO2 (gás carbônico) – que, por sua vez, precisa ser eliminado. Nos animais com sistema circulatório, esses gases são transportados através da circulação sanguínea, onde ocorrem trocas com o ambiente externo por diferentes meios. As trocas de gases seguem o mesmo princípio. Seja nas brânquias, pulmões ou pele, os vasos sanguíneos estão quase em contato direto com o ar atmosférico, separados apenas por uma membrana fina, o suficiente para permitir a difusão dos gases que fluem naturalmente do lado em que sua concentração é maior para onde estão menos concentrados1.

Dessa forma, para que as salamandras-sem-pulmão possam respirar com eficiência, elas precisam ter uma pele bastante  fina e muito vascularizada, tornando esses animais extremamente vulneráveis à desidratação. Por esse motivo, as salamandras-sem-pulmão precisam viver em proximidade a corpos d’água ou em ambientes muito úmidos. Além disso, diferentemente dos pulmões e das brânquias, a pele não é facilmente ventilada, o que dificulta a regulação da respiração. Porém, as salamandras-sem-pulmão são capazes de contornar esse problema ao apresentar um grande controle sobre a circulação sanguínea em sua pele, o que, somado ao seu metabolismo lento, permite com que sobrevivam a ambientes com pouquíssima disponibilidade de O22.Se comparada à das salamandras-sem-pulmão, a pele dos seres humanos é pouco vascularizada e muito mais espessa. Por isso, o O2 atmosférico só é capaz de penetrar nas camadas mais superficiais da pele, pouquíssimo irrigadas por vasos sanguíneos. Dessa forma, a contribuição da respiração cutânea para as demais partes do corpo é insignificante. Ainda assim, as células dessas camadas mais superficiais da pele possuem o ar atmosférico como sua principal fonte de O25. Portanto,  podemos afirmar que sim, nós humanos respiramos pela pele.

Figura 2: O percentual de trocas de O2 e CO2 que ocorrem através da pele em vertebrados. Fonte: Hill et al. (2012).

Referências:

[1] Hill, Richard W.; Wyse, Gordon A.; Anderson, Margaret. Fisiologia Animal, 2° ed. Porto Alegre: Artmed, 2012.

[2] Tattersall, Glenn J. Skin Breathing in Amphibians. In: Aird, William C. Endothelial Biomedicine. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.

[3] Lewis, Zachary R. et al. Developmental basis of evolutionary lung loss in plethodontid salamanders. Science Advances, [S.L.], v. 8, n. 33, p. 1-15, 19 ago. 2022.

[4] McEntire, Kira D.. Arboreal Ecology of Plethodontidae: a review. Copeia, [S.L.], v. 104, n. 1, p. 124-131, mar. 2016.

[5] STÜCKER, M. et al. The cutaneous uptake of atmospheric oxygen contributes significantly to the oxygen supply of human dermis and epidermis. The Journal Of Physiology, [S.L.], v. 538, n. 3, p. 985-994, fev. 2002.

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