As gigantescas aves da Nova Zelândia de um passado não tão distante

Texto por: Arthur de Souza Baggio

Quando você pensa em uma ave, qual é o primeiro animal que vem à sua mente? Provavelmente, dentre as mais diversas respostas que se podem registrar, a maioria delas representam alguns exemplos comuns do nosso dia-a-dia. Muitos pensam em galinhas, outros em patos, e a maioria pensa em algum tipo de passarinho do grupo Passeriforme, representados por organismos geralmente pequenos. Mas e quanto as pessoas que tiveram a oportunidade de ficar lado a lado com uma ave de grande porte? Essa experiência é bem rara atualmente, visto que poucos tiveram a sorte de vislumbrar com os próprios olhos uma avestruz, ema ou um casuar. Porém, essas pessoas, facilmente pensariam nessas aves gigantescas ao se deparar com essa pergunta. Embora existam poucas aves de grande porte atualmente, o nosso planeta já foi povoado por muitas delas no passado, desde predadoras de topo, como as “Aves-do-terror”, na América do Sul, até grandes voadoras com envergadura de mais de 6 metros, como a Pelagornis sandersi, na América do Norte. Porém, neste texto, não será tratado apenas de um grupo contendo as maiores aves que já existiram, mas também, explora-se aspectos importantes da sua vida. Estes, por sua vez, englobam características biológicas, morfológicas, ecológicas e os fatores que causaram a extinção do grupo. Além de demonstrar algumas de suas principais espécies, bem como suas reconstruções artísticas.

NOVA ZELÂNDIA: O ISOLAMENTO INSULAR

Se você em algum momento ouviu falar da Nova Zelândia, país localizado na Oceania, é provável que tenha descoberto que este é dotado de grande beleza natural, intocado devido ao seu isolamento geográfico e denotado de uma história natural única. Essa história, se inicia há aproximadamente 180 milhões de anos, enquanto o país ainda fazia parte de um grande continente localizado mais ao sul da linha do equador, chamado de Gondwana. A sua fragmentação se deu mediante a um processo conhecido como deriva continental, movimento no qual  os continentes, compostos por grandes placas tectônicas, se deslocam levando-o, gradualmente, ao isolamento insular que vemos hoje.

Não é incomum vermos faunas e floras extremamente raras em ilhas, esse fenômeno já foi muito estudado, o próprio naturalista Charles Darwin observou e reportou isto nas Ilhas Galápagos. Estas, ficaram conhecidas como “Laboratórios naturais” devido às suas várias espécies endêmicas, ou seja, que não são encontradas em nenhum outro lugar do mundo. Salienta-se que esses laboratórios permitem que a evolução ocorra de uma maneira isolada das grandes massas de terras, uma vez que possibilita o “Isolamento insular”. 

Na  Nova Zelândia isso não é diferente, ela esteve separada do restante do mundo por tempo suficiente para gerar suas faunas incomuns, sejam elas remanescentes do antigo continente Gondwana, ou imigrantes provenientes de terras distantes. Esses colonizadores, teriam chegado pela água ou pelo ar, colonizando assim um novo mundo, rico em recursos e livre de predadores. Segundo Bunce e colaboradores (2009), durante esse período de isolamento que começou logo após a fragmentação do supercontinente, há cerca de 82 milhões de anos, o país se tornou um berçário que abrigou cerca de 245 espécies de aves, seja na Ilha do Norte ou na Ilha do Sul. Mas, por que a Nova Zelândia foi tão segura para as aves? Pois os mamíferos estavam ausentes, e portanto, não ofereciam perigo de predação ou competição por recursos alimentares e habitacionais. Acrescenta-se ainda, que este país tenha sido a última grande massa de terra a receber a espécie humana. 

Sendo assim, atualmente encontramos uma série de animais peculiares na Nova Zelândia, mas no passado poderíamos nos deparar com muitos outros organismos distintos. É o caso de uma ave diferente de tudo que já vimos, estamos falando da “Moa”, uma das maiores aves a pisar sobre a Terra, a personagem principal que será explorada neste texto a partir de agora.

 A PERSONAGEM PRINCIPAL: ASPECTOS DA BIOLOGIA DA MOA

O termo “Moa” deriva do Maori, etnia que conviveu com a ave por pelo menos 100 anos, no que hoje chamamos de Nova Zelândia. Elas fizeram parte de uma ordem completamente extinta, chamada de Dinornithiformes, nome dado devido ao gênero Dinornis. Tais aves são representantes de um grupo chamado de “ratitas”, conhecidas por terem suas asas atrofiadas, como é o caso das avestruzes, emas, emus, casuares, kiwis, entre outros. Entretanto, no caso da Moa, a asa não só era atrofiada, como também não tinha mais nenhum vestígio ósseo, característica que é específica deste grupo.

A sua aparência era sem dúvidas muito distinta, já que algumas das espécies do gênero tinham um tamanho muito superior ao da maior ave atual, o avestruz-africano Struthio camelus, podendo alcançar até 3,6 metros de altura, e com um peso superior a 200 quilogramas, como é o caso da Dinornis robustus. Também, tinham o corpo relativamente esguio, com um pescoço alongado, ligado a uma cabeça que era pequena, larga e achatada, além de ser munida de um bico forte e curvo, utilizado para obter seu alimento fibroso. Alguns restos mumificados da espécie Megalapteryx didinus foram obtidos pelo Museu Tongarewa em 1943, revelando uma pele escamosa nas suas pernas robustas e penas que variam de grossas a finas, lisas a desgrenhadas, recobrindo o seu corpo.

A partir dos estudos paleontológicos, focados na paleoecologia, uma série de cientistas uniu as peças do quebra-cabeças descobrindo o hábito alimentar dessas gigantes. Ambas as espécies eram herbívoras, ou seja, se alimentavam de folhagens de plantas, principalmente de arbustos baixos e ervas que cresciam em zonas semiáridas com alta pluviosidade. Dá pra acreditar? Gigantes vegetarianas! Mas, como elas trituravam todas essas folhas sem ter dentes? Acontece que alguns sítios paleontológicos continham gastrólitos, do grego “gastro” referindo-se ao estômago, e “lito” à pedra, que são pequenos seixos ingeridos por grandes herbívoros de alimentação deficitária. Estes, auxiliam na trituração da matéria vegetal na moela destes animais, enquanto se movimentam. Ademais, os mesmos são encontrados em várias outras espécies, sejam extintas ou viventes, que compartilham problemas de mastigação.

Pesquisas feitas com fósseis de plantas e coprólitos de Moa, isto é, fezes fossilizadas da ave, revelaram uma grande especialização dietética (COOPER et al., 1993). Isso abre a hipótese de que parte das espécies de plantas da Nova Zelândia foram consumidas pela ave, e poderiam ter se adaptado a essa condição de predação, o que chamamos de coevolução. Caso isso seja verdade, explicaria o fato de que várias dessas plantas estão ameaçadas de extinção atuamente. Para ilustrar melhor esse caso, no qual um organismo molda o outro, os mesmos pesquisadores elencaram características encontradas nas plantas nativas que evidenciam a sua resposta em relação à pastagem da ave. Estas englobam o surgimento de espinhos, mimetismo, camuflagem e entrelaçamento dos ramos, tudo isso teria sido importante para minimizar a perda de folhas, parte crucial da planta para obtenção de energia.

FIGURA 1: O esqueleto de Emeus crassus (reconstrução artística autoral).

Fonte: Autor, 2025.

PARENTES DISTANTES, MAS PRÓXIMOS

Se você tivesse que apontar o parente mais próximo da Moa, sem fazer qualquer estudo prévio, provavelmente escolheria alguma ave ratita que habita alguma região próxima, como é o caso do Kiwi-da-Nova-Zelândia. Essa pequena ave símbolo do país, o kiwi do gênero Apteryx, seria o primeiro candidato a apresentar parentesco com a grande Moa. Pelo menos, foi isso que os cientistas pensaram antes do advento da tecnologia do DNA, que inclusive foi um dos grupos extintos mais bem estudados sob essa perspectiva genômica (ALLENTOFT et al., 2012).

Tais pesquisas revelaram que a filiação entre as “grandonas” em os “pequeninos” envolveram erros, essa confusão foi solucionada pela análise do DNA mitocondrial da Moa, uma vez que representa o fóssil mais antigo a ter material genético preservado, com cerca de 19.000 anos, no caso da espécie alpina Megalapteryx didinus. Na Nova Zelândia, há diversos ambientes de turfa anóxica que favorecem a preservação do fóssil e do DNA por mais tempo do que o esperado. Além disso, os dados reforçam que o ancestral da Moa chegou no local por voo da América do Sul ou Antártica, há 60 milhões de anos, desbancando a ideia anterior, que alegava que a ave era remanescente do antigo continente Gondwana.

Sendo assim, se a Moa não é uma parente próxima do kiwi, quem poderia ser? Essa questão foi novamente explicada por Baker e colaboradores (2014), com o uso de novas técnicas de utilização do material genético mitocondrial. Na qual conceitua-se que um grupo de aves da América do Sul, chamados de tinamus, foram o grupo “irmão” da Moa, ou seja, há pelo menos 60 milhões de anos, existiu como um ancestral voador comum aos Tinamiformes e Dinornithiformes.

 ATÉ AS GIGANTES CORREM PERIGO

Apesar de seu tamanho avantajado, não pense que a nossa protagonista não tinha predadores naturais. A Águia-de-haast, de nome científico Hieraaetus moorei, foi uma ave de grandes proporções que viveu na Ilha Sul da Nova Zelândia. Esta chegava a pesar até 15 quilogramas, com uma envergadura de cerca de 2,5 metros. Isso foi sem dúvidas o suficiente para tornar a Moa sua presa em potencial, pois há registros de perfurações feitas pela águia em vários fósseis. Estas, tinham pés muito grandes e fortes, visto que certamente perfuravam a cabeça e o pescoço da presa durante seu ataque, deixando-a morrer por hemorragia e retirando a sua carne com a ponta de seu bico recurvado, como fazem as aves de rapina atuais. 

Inclusive, de acordo com algumas lendas Maoris, a águia era capaz de caçar até humanos, mesmo que estejam referindo-se a crianças, este é um feito impressionante para uma ave. Infelizmente, ou felizmente para nossa espécie, essa ave já se extinguiu. Segundo a hipótese mais aceita na comunidade científica, logo após a chegada dos Maori muitas aves foram caçadas até seu extermínio completo, esgotando assim a única fonte de alimento da águia, o que reduziu a sua população até que desaparecessem por completo. Com isso, é provável que a sua extinção tenha ocorrido antes mesmo da chegada dos europeus à Nova Zelândia.

NÃO ERA APENAS “A MOA”, MAS “AS MOAS”

A Taxonomia, ciência que permite classificar e descrever, não só os animais atuais, como também aqueles que já foram extintos, possibilita a compreensão do parentesco das Dinornithiformes. A ordem conta com pelo menos três famílias, Megalapterygidae, Emeidae e Dinornithidae. Essas famílias têm cerca de seis gêneros, Megalapteryx, Anomalopteryx, Euryapteryx, Emeus, Pachyornis e Dinornis. Dentre essas encontram-se  nove espécies que habitaram toda a Nova Zelândia, isto é, tanto a Ilha do Norte, quanto a Ilha do Sul. No entanto, para que a comunidade científica chegasse à conclusão do número de espécies, tiveram que estudar excessivamente as características morfológicas e genéticas do grupo. A primeira descrição de uma Moa foi feita em 1980, por Richard Owen, e desde lá, os artigos científicos que tentaram descrever as espécies chegaram a cogitar até mais de 60 espécies de moas. Apesar das Dinornithiformes terem sido bastante numerosas em espécies, as pesquisas de Bunce e colaboradores (2009), sugerem que o grupo divergiu a relativamente pouco tempo, cerca de 5 milhões de anos. 

A Geologia do país, revela que os Alpes do Sul começaram a se elevar, o que causou uma mudança na distribuição do regime de chuvas. Esse evento proporcionou uma diferenciação entre ambientes alpinos e planícies, bem como habitats úmidos e secos, fator essencial para provocar a especiação no grupo, diversificando o número de espécies. Além disso, as mudanças climáticas do Pleistoceno, período entre 2,5 milhões e 11,7 mil anos, parecem ter sido importantes para a dispersão das espécies e sua diversificação.

Ficou curioso para conhecer mais sobre essas espécies? Para ilustrar melhor essa diversidade, serão apresentadas algumas delas a seguir, iniciando pelo nome dado na tradição Maori unido ao seu nome científico. Ademais, serão mostradas obras que caracterizam as espécies referidas, por meio de desenhos autorais.

MOA MAMONA – Emeus crassus

Conhecida como “Moa oriental”, essa ave tem seu próprio gênero. Vivia principalmente no leste da Ilha Sul, onde sua proporção de tamanho aumentava conforme mais ao sul se encontravam. Suas fêmeas possuíam tamanhos maiores que seus machos. Estes últimos apresentavam uma traqueia alongada, o que com certeza auxiliou em suas vocalizações. De modo geral, suas pernas eram curtas e grossas e sua cabeça era pequena com um bico delicado. Já suas penas eram desgrenhadas.

FIGURA 2: Recriação de Emeus crassus (reconstrução artística autoral).

Fonte: Autor, 2025.

 MOA NUNUI – Dinornis robustus

Conhecida como “Moa gigante da Ilha Sul” foi uma das maiores aves a existir. Habitou amplamente todos os espaços da região, desde dunas costeiras até florestas e campos mais interiores e próximos à região alpina. Uma de suas marcas registradas era o pescoço comprido, com três vértebras adicionais em relação às outras aves do grupo. Ainda, possuíam  o maior dimorfismo sexual, com fêmeas muito maiores que os machos. Ademais, foi a ave mais alta conhecida pela ciência, de corpo esbelto e cabeça pequena. Possuía um bico robusto, o que lhe dava o posto de grande herbívora, capaz de comer vegetais fibrosos. Também, pode-se pontuar a sua grande câmara olfativa, o que gerou debates científicos sobre a capacidade de olfato.

FIGURA 3: Recriação de Dinornis robustus (reconstrução artística autoral).

Fonte: Autor, 2025.

MOA HAKAHAKA – Euryapteryx curtus

Conhecida como “Moa de pernas curtas” esta ave coleciona diferenças que a coloca no seu próprio gênero. Viveu, principalmente, em regiões mais secas, havendo uma variação muito grande de tamanho que dificultou a descrição da espécie, já que eram mais pequenas na região Norte do que na Sul. Portanto, já foi sugerido que o gênero Euryapteryx tinha subespécies

Como seu próprio nome diz, elas tinham pernas curtas, eram robustas, com pés muito largos, possuíam um bico compacto e penas grossas com padrões listrados, de acordo com alguns restos mumificados. A Ecologia afirma que tinham uma dieta bastante diversificada, pastando arbustos e ervas, além de levar cerca de nove anos para atingir o tamanho adulto.

FIGURA 5: Recriação de Euryapteryx curtus (reconstrução artística autoral).

Fonte: Autor, 2025.

O PONTO FINAL DA NOSSA PROTAGONISTA

Até aqui descobriu-se muito sobre os feitos dessas aves icônicas da Nova Zelândia. Seu lar se isolou a muito tempo, oferecendo um ambiente bastante próspero para sua evolução. Nota-se também, muitos aspectos importantes da Biologia desses seres, desde a sua origem, diversificação, estratégia alimentar e relação com outros organismos contemporâneos. Mas, agora, explorar-se-á alguns dos aspectos que explicam o seu desaparecimento, marcando a queda dessa linhagem até a sua extinção completa, cerca de 200 anos após a chegada dos Maori.

Durante o Holoceno, período geocronológico que iniciou-se há cerca de 11,65 mil anos, uma série de alterações faunísticas ocorreu em todo o globo, causando a extinção de grupos de animais de grande porte, conhecidos como “Megafauna”. Essa extinção, ainda ocupa o centro dos debates geológicos e paleontológicos, uma vez que há duas principais teorias que tentam explicar essa rápida derrocada dos “grandões”. Uma delas é discutida por uma série de pesquisadores atuais, a qual evidencia as grandes alterações climáticas ocorridas com as fases de glaciação e interglaciação do nosso planeta, no qual as fases glaciais, que perduraram por muito tempo e de frio rigoroso, são conhecidas como a “Era do Gelo”. Isto, por sua vez, geraria uma mudança tão brusca na vegetação que deixaria muitos animais sem grande parte de sua fonte de alimento, o que obrigaria o surgimento de competição entre espécies pelo que restou. Já a outra teoria, discutida inicialmente por Paul Schultz Martin, busca explicar o desaparecimento de diversos grupos de animais pelo avanço rápido de uma das espécies mais perigosas do reino animal. Ao ter que adivinhar qual espécie seria capaz disso, em qual animal você pensaria primeiro? Talvez poderia ser o “Tigre-dentes-de-sabre”, com aqueles dentes super afiados? Mas, não foi ele, pois ele também foi vítima da extinção da Megafauna. De modo geral, refere-se a um predador de porte médio, bípede, com postura ereta, habilidades de manuseio de ferramentas e capacidade de “bolar” estratégias em grupo para alcançar seus objetivos, como a caça e a autodefesa. Nesse ponto, é coerente deduzir  que se faz a descrição de nossa própria espécie, o Homo sapiens.

A partir disso, não é de se espantar que a nossa espécie tenha causado muitas extinções no passado, se comparamos com o cenário atual. Desde os primórdios da evolução humana, denotamos nosso crescimento populacional e expansão territorial desenfreada. Isso colocou diversas espécies na mira dos caçadores, muitas delas não tiveram tempo suficiente para se habituar com o humano como um predador, uma vez que visualmente não as intimidamos tanto quanto os tigres-dentes-de-sabre, mas coletivamente fazemos a diferença.

Sendo assim, a teoria Overkill, conhecida no português como “Grande Matança”, busca estudar as datas da chegada dos primeiros humanos em novos continentes, e comparar com as datas aproximadas das extinções de muitos representantes da Megafauna, como vemos no livro “O Poema Imperfeito” de Fernando Fernandez. No caso da nossa protagonista, que foi extinta logo após a chegada dos Maori no século XIII, nota-se que a Nova Zelândia sofreu com uma rápida devastação da cobertura florestal e com ama onda de extinções faunísticas. Com isto, discute-se a possibilidade do processo de extinção ocorrer devido ao aumento da mortalidade das diferentes espécies de Moa, gerada pela caça, coleta dos ovos, fragmentação, ou pela perda do habitat natural e introdução de outros animais. 

No entanto, as provas da superexploração são indiscutíveis, montes de fósseis e ovos da Moa são encontrados empilhados frequentemente em sítios arqueológicos, estes funcionaram como locais de açougue e alimentação nos assentamentos humanos. Ademais, pode-se afirmar que na Nova Zelândia haviam habitats naturais durante a colonização europeia, que ocorreu algum tempo depois do desaparecimento da ave, refutando a hipótese da extinção pela degradação ambiental, levantada anteriormente. 

Por fim, é importante ressaltar que a Moa tinha uma fase juvenil bem longa, portanto levava muito tempo para chegar a sua maturidade sexual e ao acasalamento. Quando acasalavam, poucos descendentes eram gerados em cada prole, assim, tornando sua densidade populacional cada vez mais baixa. Essas características, revelam a fragilidade da estabilidade populacional da Moa frente à caça excessiva, já que qualquer redução no número de adultos era o suficiente para causar um colapso demográfico precoce. Enquanto isso, a população humana crescia rapidamente, e no final do século XIV,  quando a temporada de caça da  Moa reduziu-se devido a diminuição de espécimes disponíveis, os caçadores procuraram outras fontes de alimentos mais fáceis.

FIGURA 6: Recriação do crânio de Emeus crassus (reconstrução artística autoral).

Fonte: Autor, 2025.

O QUE SABEMOS ATÉ AGORA…

Com base nesta leitura, pode-se conceber uma série de aspectos de importância e curiosidade sobre a vida e extinção das “Gigantescas Aves do passado não tão distante da Nova Zelândia”. Compreende-se que pode até ter sido a caça, ou quem sabe a destruição dos ambientes naturais da Nova Zelândia que levou as nove espécies de Moa à extinção. Mesmo assim, essa imensa ave vive no imaginário de diversos pesquisadores, desde sua primeira descrição, e quem sabe, ela também irá povoar a sua mente! Ainda temos muitas questões a serem resolvidas sobre a nossa personagem principal, para isso, necessita-se de mais pesquisadores entusiasmados para desvendar os mistérios da Moa.

REFERÊNCIAS

ALLENTOFT, Morten Erik et al.. Extinct New Zealand megafauna were not in decline before human colonization. Proceedings Of The National Academy Of Sciences, v. 111, n. 13, p. 4922-4927, 17 mar. 2014.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1073/pnas.1314972111.

ALLENTOFT, Morten E.; RAWLENCE, Nicolas J.. Moa’s Ark or volant ghosts of Gondwana? Insights from nineteen years of ancient DNA research on the extinct moa (Aves: dinornithiformes) of new zealand. Annals Of Anatomy – Anatomischer Anzeiger, v. 194, n. 1, jan. 2012.  Disponível em:  http://dx.doi.org/10.1016/j.aanat.2011.04.002.

BAKER, Allan J. et al. Genomic Support for a Moa–Tinamou Clade and Adaptive Morphological Convergence in Flightless Ratites. Molecular Biology And Evolution, v. 31, n. 7, p. 1686-1696, 13 maio 2014.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1093/molbev/msu153.

BUNCE, M. et al. The evolutionary history of the extinct ratite moa and New Zealand Neogene paleogeography. Proceedings Of The National Academy Of Sciences, v. 106, n. 49, 8 dez. 2009.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1073/pnas.0906660106.

COOPER, Alan et al. Evolution of the moa and their effect on the New Zealand flora. Trends In Ecology & Evolution, v. 8, n. 12, dez. 1993. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/0169-5347(93)90005-a.

FERNANDEZ, Fernando A. S.. O poema imperfeito: crônicas de Biologia, conservação da natureza, e seus heróis. 2 a ed. Curitiba, 1999.

HOLDAWAY, R. N.; JACOMB, C.. Rapid Extinction of the Moas (Aves: dinornithiformes). Science, [S.L.], v. 287, n. 5461, p. 2250-2254, 24 mar. 2000.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1126/science.287.5461.2250.

Home page. New Zealand Birds Online: The digital encyclopaedia of New Zealand birds. Acesso em 20/01/2025. Disponível em: https://www.nzbirdsonline.org.nz.

Home page. Puke Ariki Coloction: Explore a coleção Puke Ariki Heritage Collection. Acesso em 10/02/2025. Disponível em: https://collection.pukeariki.com/explore/.

PERRY, George L.W. et al. A high-precision chronology for the rapid extinction of New Zealand moa (Aves, Dinornithiformes). Quaternary Science Reviews, v. 105, p. 126-135, dez. 2014.  Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.quascirev.2014.09.025.

WOOD, Jamie R..High-Resolution Coproecology: Using Coprolites to Reconstruct the Habits and Habitats of New Zealand’s Extinct Upland Moa (Megalapteryx didinus). PLoS ONE, v 7, n. 6, jun. 2012. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/22768206.

WORTHY, Th; SCOFIELD, Rp. Twenty-first century advances in knowledge of the biology of moa (Aves: dinornithiformes). New Zealand Journal Of Zoology,, v. 39, n. 2, jun. 2012. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1080/03014223.2012.665060.


GLOSSÁRIO

Aves-do-terror – Grupo de aves da família Phorusrhacidae, dentro da ordem Cariamiformes, que como o nome sugere, contém a seriema, última descendente dessa linhagem. Sua origem se dá após a queda dos dinossauros não avianos, onde então se diversifica e ocupa o papel de predadora de topo das cadeias alimentares da América do Sul de 60 milhões a 2,5 milhões de anos atrás. Tinham um tamanho muito maior do que o esperado para uma ave, com uma grande cabeça e o bico maciço em forma de gancho, utilizado para abater grandes presas correndo em alta velocidade.

Coevolução – Esse fenômeno é usado de forma recorrente na Ecologia, seu sentido expressa que duas ou mais espécies convivem e exercem uma certa pressão seletiva entre si, podendo acarretar em uma série de adaptações entre esses organismos, como por exemplo as adaptações encontradas nos polinizadores e nas  flores em que se alimentam.

Dimorfismo sexual – A partir de estudos da Zoologia (Brusca & Brusca 2003), o dimorfismo sexual pode ser entendido como as diferenças morfológicas e fenotípicas encontradas em vertebrados e invertebrados, além dos órgãos reprodutivos, podem ocorrer variações de forma, tamanho, cor e presença de estruturas especializadas. A sua possível origem reside nas pressões da seleção sexual, na competição para acasalamento, além de adaptações ao meio.

DNA – O ácido desoxirribonucleico é uma molécula presente nos organismos que contém o código genético necessário para a sua construção, ou seja, essa molécula decodifica os componentes que irão formar um organismo, da mesma forma que uma receita. Na conformação celular, o DNA se localiza no núcleo da célula, onde é responsável pela produção do maquinário necessário para o seu funcionamento e pela manutenção dos processos vitais na forma de material genético, condensado numa fita de dupla hélice.

DNA mitocondrial – Para além do DNA nuclear, as células munidas de uma organela chamada de mitocôndria, possuem o DNA mitocondrial. As mitocôndrias estão presentes em grande número nas células vegetais e animais, e são oriundas de uma digestão ineficiente de bactérias antigas segundo a teoria endossimbiótica. Devido a sua abundância em detrimento do DNA nuclear que é único, se utilizam com maior frequência em estudos forenses, de genealogia, e até na análise de materiais fósseis.

Especiação – Para a biologia evolutiva, esse processo marca o surgimento de uma nova espécie com base em uma série de mudanças de cunho genético e evolutivo em uma população prévia. Todo evento que impede o fluxo gênico tem potencial para gerar novas espécies, desde o isolamento geográfico, ecológico, comportamental ou até genético.

Habitats – Sob a perspectiva ecológica, se refere ao ambiente físico onde um organismo vive, estabelecendo interações com outros seres (fatores bióticos) e reagindo às condições ambientais (fatores abióticos).

Ilhas Galápagos – São ilhas de rochas vulcânicas que fazem parte do arquipélago de Galápagos, localizadas no Oceano Pacífico cuja costa continental mais próxima é da América do Sul. Receberam a visita do ilustre naturalista inglês, Charles Darwin, a bordo da embarcação HMS Beagle que partiu em 27 de Dezembro de 1831 para conhecer aspectos hidrográficos da América do Sul. No entanto, sua estadia em Galápagos ofereceu suporte para delinear a teoria evolutiva publicada um tempo depois em sua obra “A Origem Das Espécies”, devido aos vários exemplos de adaptação, seleção natural e descendência comum.

Mumificados – A mumificação é um tipo de fossilização raro dos tecidos moles, esse processo preserva de maneira excepcional devido ao isolamento do material biológico com o meio externo decompositor. Isso pode se dar a partir da inclusão na resina fóssil chamada de âmbar, no alcatrão de poços de piche, ou até mesmo no congelamento do organismo

Paleoecológicos – A Paleoecologia é uma das áreas da Paleontologia, munida de conhecimentos da Ecologia, que estuda os ecossistemas que existiram no passado. Ela permite a inferência das interações entre organismos extintos e seu meio ambiente.

Passeriforme – Segundo a classificação taxonômica, o grupo passeriforme representa a ordem de aves mais diversas, incluindo desde aves pequenas como os pássaros (de onde deriva o nome), até médias, como por exemplo as gralhas. Muitas delas são lembradas pela sua capacidade de canto.

Ratitas – Representam um grupo artificial de aves, criado por compartilhamento de algumas características que incluem: asas geralmente atrofiadas, osso do esterno sem seu formato de quilha característico, membros inferiores reforçados para a movimentação e contato com o solo, e geralmente incapazes de voar.

Subespécies – Sob a perspectiva biológica, uma subespécie se refere a uma população de uma espécie que tem características morfológicas, genéticas ou ecológicas distintas o suficiente das outras populações. Entretanto, essas populações ainda são intercruzantes, capazes de gerar uma prole fértil. É provável que uma subespécie se origine de um isolamento geográfico, ou até por uma pressão evolutiva distinta da espécie em geral.

Tinamiformes – Segundo a taxonomia, representa uma ordem de aves com uma única família viva, cujos representantes são inhambus e codornas que se estabeleceram na América desde o Mioceno, e ocupam diversos territórios desde a América do Norte até a América do Sul. Uma característica importante do grupo é a dominância das fêmeas no territorialismo, enquanto a postura dos ovos é uma tarefa dos machos.

Deixe um comentário