Mas eu posso tocar?

Essa é uma das frases mais usadas quando encontramos algum animal silvestre fofo ou interessante. Claro que para animais domésticos, essa pergunta é mais rara, geralmente já passamos a mão e pronto. Somos seres emotivos, muitas vezes sentimos a necessidade ao toque, dar um abraço, fazer um carinho quando estamos felizes ou curiosos. Contudo, quando nos referimos a animais silvestres, principalmente quando não são mamíferos, as coisas podem ser um pouco diferentes. Essa sensação boa que sentimos ao tocar, nem sempre é tão boa para eles, e pior, muitas vezes pode ser estressante.
E como vou saber se está sendo um incômodo para o bichinho? Bem, essa não é uma pergunta muito fácil de responder, pois muitos não têm expressões faciais, como aves, tartarugas, coelho, entre outros… Reparem como nós humanos, temos uma afinidade maior com os animais que conseguimos compreender suas emoções, ou seja, geralmente quando elas são parecidas com a nossa. Quando nos referirmos à megafauna, ainda existe uma atenção maior por parte das pessoas. Porém, quando tratamos de invertebrados, como insetos, lesmas, borboletas, abelhas, estrela do mar, corais, entre outros, fica bem mais complicado. Um exemplo, que vou abordar mais, é a relação dos mergulhadores com os animais. A cada dia é mais frequente a prática de mergulho autônomo (uso de uma fonte de ar – cilindro). É uma das atividades mais realizadas pelas pessoas para vivenciar um pouco do mundo submerso, é através do “batismo”. O “batismo” é um mergulho guiado por um profissional capacitado. Quem já fez o “batismo”, já deve ter ouvido falar: “Não toquem em nada, daqui o que levamos são fotos”. Se não ouviu, pelo menos deveria. “Ah, mas aquela estrela? Ela é tão linda! Não posso nem pegar na mão? ” E a resposta é “não”. E geralmente fica por isso: não pode tocar em nada mas também não compreende muito bem o porquê disso. Assim, deixamos nosso ímpeto curioso falar mais alto e lá vamos nós colocar nossos dedões. Quando estamos tocando nos animais que vemos durante o mergulho ou pegamos na mão (o que é pior), estamos tendo uma atitude egoísta diante a vida marinha. Perguntas que devemos nos questionar: Quantas pessoas mergulham neste ponto por dia, semana e mês? E se todos pegarem esse animal na mão? Sim, porque se uma pessoa pode, os outros também devem poder. O que eu sei sobre o que estou pegando? Aquele animal está estressado? Será que eu estou machucando-o? Sim, são muitas perguntas que devemos nos fazer antes de tocar e/ou pegar. Geralmente organismos marinhos são sensíveis ao toque, possuem estruturas frágeis ao longo do corpo. Outras vezes, por mais inofensivo que o animal possa parecer, você pode se machucar com substâncias venenosas, causar uma irritação na pele, perfurar, entre outros. O mergulho por si só já causa impacto. Existem alguns estudos que mostram que incidentes, como por exemplo batidas de nadadeiras no fundo, são frequentes entre os mergulhadores iniciantes e “experientes” (por incrível que pareça). Estes incidentes podem resultar em impactos aos organismos que vivem associados ao fundo (organismos bentônicos) a curto e longo prazo, incluindo quebras de colônias de corais, mortalidade por atrito e efeitos da suspensão de sedimentos. A presença, por si só, dos mergulhadores, pode alterar a distribuição de espécies, causar mudanças na estrutura de comunidades e danos físicos aos corais e organismos bentônicos associados. Então, na dúvida, não toque. Lembre-se que sua curiosidade não pode ser superior ao comprometimento de uma vida que quase não sabemos a respeito. Se eu pegar na mão, a pessoa que está comigo também pode. Se você estiver acompanhando um mergulhador menos experiente que você, você é o exemplo. “Ah, mas tem instrutor e/ou divemaster que tocam!” Sim, infelizmente tem. Profissionais mal qualificados temos no mundo inteiro, e caso conheceres mergulhadores que possuem essa prática, procure por outros profissionais com atitudes mais sustentáveis e prudentes. O mergulho tende a trazer pessoas mais comprometidas e conscientes para a preservação do oceano. Então, vamos estimular essa última prática?

3 comentários em “Mas eu posso tocar?”

  1. Muito legal o texto, Jéssica.
    Eu sou uma que adora ver as coisas com as mãos, as vezes pegamos no impulso, mas sem intenção de machucar. Por isso é importante sempre alguém qualificado orientar nos batismos.
    Muito legal o texto.

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  2. Excelente matéria Jessica, eu como Instrutor de Mergulho tento passar o máximo de tudo que você falou para meus alunos, citando inclusive o impacto que esse "toque" pode causar. Mas infelizmente como você mesmo disse, exitem profissionais que infelizmente não pensam desse jeito.

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